37 iguarias que estão sempre na mesa das famílias brasileiras são detonadas pelos estadunidenses
A lista divulgada hoje (9) pelo site americano TasteAtlas, apontando as piores comidas brasileiras feriu o nosso orgulho. Mas há que se perdoar, afinal, sem querer ofender os estadunidenses, mas gastronomia não é, nem nunca foi, o forte deles. E com todo respeito ao hambúrguer, que adoro por sinal, um país que tem esta e outras iguarias, digamos, pouco criativas, como waffle, donuts, hot dog e macarrão com queijo, como os pratos mais típicos do país, não mereceria nem comentário!
Cuscuz paulista foi considerado item número 1 da lista
Mas, claro que deve-se comentar. E não só, deve-se protestar. Afinal, a cozinha brasileira é um dos nossos orgulhos e é retrato da nossa diversidade, da nossa ancestralidade. Quem, em são consciência, ousa falar mal do nosso sagrado Caruru, apontado na famigerada lista que reúne 37 iguarias nacionais consideradas as piores do Brasil. Para o antropólogo Vilson Caetano, professor da Universidade Federal da Bahia e pesquisador da gastronomia, a lista só reforça o critério do colonizador que se utiliza disso para expor o seu preconceito com a culinária identitária.
Jurados também não aprovaram a maniçoba adorada por baianos e paraense
“Você não pode desassociar o comer de história. Então quando se coloca estas comidas entre as piores do mundo, você tem aí uma série de preconceitos, de racismo, de estigmatizações que foram construídas ao longo da história, imputáveis nestas populações que resistem ao tempo e fazem com que essas comidas se mantenham presentes sempre como demarcadores de identidade”, defende. Caetano diz que maioria das iguarias citadas são comidas chamadas identitárias. “O caruru, o pé de moleque, o cuscuz paulista, são comidas que guardam histórias de grupos muito específicos, que ao longo dos séculos, foram alijados do processo histórico”.
Nem os singelos casadinhos que fazem a alegria de festas infantis sensibilizaram os avaliadores
De acordo com a publicação, considerada séria pela comunidade gastronômica mundial, foram realizadas perto de 7,5 mil avaliações, até o mês passado. Os jurados não pouparam nem os cortes populares no Brasil, como o Acém, Paleta e o Lagarto, este último que parece ter sido criado na medida para o nosso tradicional lombo recheado com linguiça e cenoura. E a famigerada lista seguiu derrubando tudo de mais rico para nós quando o assunto é culinária. Na esteira foram o sequilho (que garante renda para muitas famílias brasileiras) e o bolo-formigueiro, que para os chefs que participaram da avaliação, não tem gosto nenhum.
A chef carioca Roberta Sudbrack ficou irritada com a lista a ponto de ler até o final
A indignação foi quase unanime entre os chefs brasileiros que trabalham dia após dia pela preservação das tradições na culinária brasileira. Em entrevista ao jornal O Globo, a chef Roberta Sudbrack disse que a avaliação foi mais uma prova de como a relação representa um desconhecimento das riquezas culturais do país.“Não cheguei nem ao final da lista. Achei uma vergonha e de uma falta de cultura absurda. É algo risível. E olha que não estou fazendo uma avaliação de como isso me atinge. Mas para entender o cuscuz paulista, por exemplo, você tem que ter vindo aqui, conhecido as tradições minimamente, se interessado pelos tantos brasis dentro de um Brasil”. Defensora e praticante da culinária brasileira raiz, Sudbrack acrescentou ainda que “a lista não reflete a forma com que os brasileiros se relacionam com a comida, ou como isso está ligado à nossa maneira de se expressar”.
Chef Fabrício Lemos diz que a lista revela o desconhecimento dos avaliadores sobre a culinária brasileira
O chef Fabrício Lemos, que descobriu a gastronomia quando viveu lá nos Estados Unidos, reforça a tese de que trata-se sim de desinformação, daí que, para ele, esse trabalho de fortalecimento da comida brasileira não pode parar. “Não só a cadeia da gastronomia, mas o poder público também que fazer seu papel de difundir a nossa culinária lá fora”, diz.
A maniçoba, um dos orgulhos do povo baiano, especialmente dos nativos do Recôncavo, também foi detonado pelo guia. Lá da região norte, onde essa iguaria é igualmente popular, o chef Thiago Castanho bradou. Em entrevista ao O Globo, o pesquisador da comida tupiniquim e grande divulgador da culinária da Amazônia rechaçou a lista. “Esse tipo não tem relevância alguma e não acrescenta em nada. Isso não faz as pessoas se interessarem pelos pratos, pelo contrário, afasta. A maniçoba, por exemplo, tem uma cultura enorme por trás. Reúne traços indígenas, africanos e europeus”.
Thiago Castanho difunde a cozinha da região norte para o mundo
Apesar da pancada na autoestima dos brasileiros, o site crava na página onde divulgou a lista, que não é o dono da verdade ou do gosto. Fato é que para eles, algumas das comidas comuns na mesa das famílias brasileiras como salada de maionese, o cajuzinho e o salpicão de frango são intragáveis.
Confira a lista dos piores pratos brasileiros, na avaliação de quem, definitivamente, despreza a cultura. Cuscuz Paulista/Arroz com Pequi/Acém/ Paleta/ Maria-mole/Lagarto/Sequilhos/Sagu/Tareco/Coxão Mole/Ostra ao bafo/Pé-de-moleque/Quibebe/Músculo/Patinho/Maniçoba/Peito/Sanduíche de mortadela/Salada de maionese/Cajuzinho/Salpicão de frango/Abará/Caldo de piranha/Biscoito de polvilho/Canjica/Mocotó/Bolo formigueiro/Caruru/Pato no tucupi/Pamonha/X-Tudo/Galinhada/Casadinhos/Barreado/Creme de papaya/Baba-de-moça/ Carne de onça.