Entre cordões, fios e cerâmica, formam-se peças cheias de afeto e raízes. Assim são as obras da artista visual Ju Fonseca. Nascida em Cruz das Almas, no Recôncavo Baiano, ela é uma das 16 artistas da Bahia presentes na exposição “Artistas do Vestir: Uma Costura dos Afetos”, em cartaz no Itaú Cultural, em São Paulo.
Ju convive com a arte desde que se entende por gente: cresceu vendo a avó confeccionando todo tipo de crochê. Na sua casa, até os botijões de gás ganhavam mimos da matriarca. “Ela fazia de tudo, do crochezinho do botijão a coisas mais elaboradas. Ela tinha muito isso de enfeitar as coisas de casa”, conta.
Foi assim que começou a trabalhar com crochê há cerca de 15 anos, criando joias em parceria com uma marca de roupas. Depois, passou a produzir acessórios, como colares feitos com pedras naturais. Durante a pandemia, descobriu e se apaixonou pela cerâmica, e hoje une todas essas técnicas em seu trabalho.
Cursando moda, Ju sempre teve em mente que queria subverter a superficialidade comumente atribuída a esse universo. Para ela, moda envolve muito mais: ancestralidade, angústias e anseios.
Tudo começou com sua avó, dona Jovelina, e os ensinamentos dela estão presentes em cada detalhe de suas peças. Sua origem se manifesta fortemente no trabalho. Os fios remetem às confecções que via sua avó fazer. Já a cerâmica é fruto da argila queimada em Maragogipinho, distrito de Aratuípe, no Recôncavo, conhecido por suas olarias.
“Aqui na Bahia, somos muito ricos em diversidade de matérias-primas naturais. Às vezes, buscamos muito o artificial, sendo que temos o natural bem aqui. Tento valorizar cada vez mais isso no meu trabalho”, defende.
Para “Corpo Vazio”, obra que levou para a exposição em São Paulo, sua intenção foi evidenciar o corpo como a própria vestimenta. Durante quatro meses, desenvolveu uma peça que inicialmente seria o próprio corpo — que, segundo ela, de vazio não tem nada: carrega sonhos, desejos e sentimentos. Contudo, ao longo do processo, sentiu a necessidade de reformular a obra e transformá-la em um grande coração feito de cerâmica e fios.
Assim o fez. Agora, finalizado diretamente na parede do Itaú Cultural, está o coração de cerca de 30 quilos. “O coração é também uma representação disso tudo. Minha inspiração foi esse momento de reflexão, a vontade de construir algo que tivesse significados amplos. Quis trazer esse contraponto do ‘vestir’, mostrar que moda é afeto, é o que a gente vive. Que o ‘corpo vazio’, na verdade, está sempre cheio de sentimentos”, conclui.